Era um sábado aquele 15 de janeiro de 1972. Flamengo e Benfica jogavam no Maracanã diante de 44.280 torcedores pelo Torneio Internacional de Verão do Rio de Janeiro, que teve, ainda, a participação do Vasco. Vestindo a segunda camisa do clube rubro-negro, aquela branca com uma faixa negra e outra vermelha no peito, Fio Maravilha pisou o gramado com o número 14 às costas em substituição ao bom ponteiro-esquerdo Arilson, já na etapa final.

O placar ainda não havia se movimentado quando o atacante negro, forte e de futebol imprevisível recebeu a bola ainda longe da meta portuguesa. De repente, Fio foi deixando, um a um, os marcadores tão tortos quanto seus dentes. Os defensores da equipe de Lisboa não conseguiram deter a arrancada do folclórico jogador do Flamengo, que conduziu a pelota até as redes do arqueiro José Henrique.

O árbitro Aírton Vieira de Moraes, conhecido como "Sansão", apontava para o centro do campo confirmando o golaço de Fio e, na arquibancada, entre os rubro-negros que deixaram Cr$ 282.727,00 nas bilheterias, Jorge Ben vibrava. O cantor naqueles tempos ainda não se identificava como "Benjor", mas já era flamenguista até a medula.

A inspiração que caiu sobre o atacante parecia tê-o alcançado. Nas horas seguintes ele iria compor a mais bela música já feita para um jogador de futebol no Brasil. "Fio Maravilha, nós gostamos de você / Fio Maravilha faz mais um pra gente ver", diz a letra emocionante que seria cantada por Maria Alcina no Festival Internacional da Canção daquele ano.

Virou "hit. Fio, que chegara ao Flamengo sete anos antes, se transformou rapidamente em personagem nacionalmente conhecido. Uma homenagem que nem mesmo os maiores compositores brasileiros conseguiu emplacar mesmo que pudessem se inspirar em Pelé, Tostão, Zico, Zizinho, Garricha, Leônidas. Nenhum dos principais craques do futebol de nosso país teve a sorte de Fio. Sua obra-prima foi eternizada por Jorge Ben.

Um presente para o atacante que completaria 27 anos quatro dias depois do golaço sobre o Benfica. Tento que levaria o Flamengo a abrir vantagem para erguer o troféu do torneio internacional com outro triunfo, sobre o Vasco, também pela contagem mínima, cinco dias mais tarde. O tempo passou e, na justiça, Fio cobrou o pagamento de direitos autorais. Viraram desafetos e Jorge Ben passou a cantar "'Filho' Maravilha", para não citar o nome de guerra do atleta.

No vídeo abaixo, Flamengo 3 x 0 Vasco de 11 de maio de 1969,
pelo Campeonato Carioca, com gol de Fio abrindo o placar em
cobrança de pênalti e fazendo embaixadinhas próximo à área
vascaína diante 86.071 torcedores no Maracanã.

O artilheiro também defendeu Paysandu, Ceub (Brasília), Desportiva (ES), Avaí e São Cristóvão (RJ), pelo qual jogou contra os rubro-negros, numa histórica virada para 3 a 2 em 29 de março de 1975. Fio encerrou a carreira nos Estados Unidos, onde vestiu as camisas de New York Eagles, Monte Belo Panthers e San Francisco Mercury, da cidade californiana onde vive até hoje.

Após pendurar as chuteiras, passou a trabalhar numa pizzaria e só não foi totalmente esquecido como tantos outros jogadores do passado graças à música de Jorge Ben. Perdeu a causa, teve que pagar os custos do advogado do compositor e anos depois se disse arrependido. Fio era homem simples, nascido em Conselheiro Pena (MG) e é compreensível que tenha se deixado levar por um advogado, como argumentou em entrevistas posteriores ao imbróglio.

Mas não é compreensível tantos artistas intelectualizados se oponham às biografias não autorizadas. Vivemos os tempos dos assessores de imprensa que operam como babás de artistas, atletas e cantores. Tempos de versões oficiais e verdades desmentidas. E é triste observar tamanho esforço de gente supostamente tão preparada e com tanta história nessa direção.

Querem direito à privacidade, menos quando aparecem em comerciais, divulgam seus shows, peças, filmes, músicas ou inauguram algo. E nos dias em que abrem as próprias casas aos fotógrafos de revistas voltadas única e exclusivamente para a vida dos "famosos". Querem biografias autorizadas que seriam livros com tudo para lembrar os press releases escritos por alguns desses assessores. Eu não compraria um. E você?

Fio Maravilha
Jorge Ben

E novamente ele chegou com inspiração
Com muito amor, com emoção
Com explosão e gol, gol
Sacudindo a torcida aos 33 minutos
Do segundo tempo
Depois de fazer uma jogada celestial
Em gol, gol
Tabelou, driblou dois zagueiros
Deu um toque driblou o goleiro
Só não entrou com bola e tudo
Porque teve humildade em gol, gol
Foi um gol de classe
Onde ele mostrou sua malícia e sua raça
Foi um gol de anjo
Um verdadeiro gol de placa
Que a galera agradecida assim cantava
Fio Maravilha, nós gostamos de você
Fio Maravilha faz mais um pra gente ver

Clique aqui e veja matéria da TV Globo sobre Fio Maravilha

Fio Maravilha no Flamengo
Nome: João Batista Sales
Data de Nascimento: 19/01/1945
Local de Nascimento: Conselheiro Pena/MG
Posição: Atacante
Jogos pelo Flamengo: 289
Primeiro jogo: 21/04/1965
Último jogo: 07/02/1973
Vitórias: 125
Empates: 92
Derrotas: 72
Gols: 79
Fonte: Flaestatística