Foto: Divulgação
A tragédia no Ninho do Urubu, que completa um ano neste sábado, envolveu diversos personagens e histórias. O sonho de Arthur, um dos dez meninos mortos no incêndio, acabou naquela madrugada do dia 8 de fevereiro de 2019, mas se renovou nos pés de seu melhor amigo da infância. Iago chegou ao Flamengo pouco tempo depois da tragédia para dar continuidade nessa parceria que foi além dos campos.
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- É difícil... (chora). Ele era muito feliz, sempre pensava em ajudar os outros. Muito bom no futebol. Tinha tudo de bom para a vida e carreira. Me inspiro muito nele. No que ele conseguiu e no que poderia conquistar. Vou tentar fazer tudo o que ele não pôde. Tudo o que eu conseguir na minha vida, vou dedicar a ele - disse Iago.
Iago é amigo de Arthur desde que começaram a jogar futsal no Sesi, em Volta Redonda, cidade onde nasceram. Desde aquela época, não se separavam. Atuaram lado a lado em uma escolinha do Fluminense e depois no Volta Redonda, até que Arthur, então com 14 anos, teve convites do Atlético-MG e Flamengo e optou por buscar seu sonho no Ninho do Urubu.
Enquanto Arthur iniciava sua trajetória no Flamengo, Iago, um ano mais novo, seguiu no Volta Redonda. Em um jogo contra o Fla, no entanto, se destacou e começou a também chamar a atenção. O chamado rubro-negro (e do Cruzeiro) chegou para ele em janeiro de 2019, mas, com 13 anos, ainda não tinha a idade mínima para ficar alojado no Ninho.
- Era uma amizade muito forte. Sempre estávamos juntos. Temos lembranças muito boas. Eu fui primeiro para o Volta Redonda, e depois o Arthur chegou. Depois, ele se destacou e foi para o Flamengo. Um inspirava o outro - contou Iago.
Como não tinham condições financeiras de bancar a permanência de Iago no Rio, seus pais Altamiro e Fabiana conseguiram que o Flamengo esperasse até que ele completasse 14 anos, em julho de 2019, e pudesse ficar alojado. O reencontro com Arthur estava marcado e os meninos não escondiam a euforia. O incêndio que causou a morte de Arthur interrompeu a parceria.
- Eu dizia para Marília (mãe de Arthur) que não teria a coragem dela de deixar. Aí lembro que comentamos que o Ninho era mais seguro. Aí nós resolvemos esperar o Iago fazer 14 anos para ir - disse Fabiana.
O dia 8 de fevereiro de 2019 não sai da memória de Iago. A notícia da morte do "irmão" fez o menino ficar recluso dentro de casa com sua dor.
- No dia eu estava na escola. Um amigo disse que tinha acontecido alguma coisa no Ninho do Urubu e que o nome do Arthur estava na lista. Eu não acreditei. Comecei a chorar e fui embora. Comecei a passar mal dentro de casa, não saía. Eu só ficava deitado. Vou sempre lembrar da última vez que eu o vi. Foi aqui em casa. Jogamos futmesa - disse Iago.
Se fizesse aniversário no início do ano, Iago possivelmente estaria alojado no Ninho ao lado dos outros meninos na noite da tragédia. Um pensamento que Altamiro e Fabiana preferem afastar da cabeça.
- Não gosto nem de pensar nisso - disse Fabiana.
Diante da proximidade dos meninos, os pais de Iago se tornaram grandes amigos de Marília, mãe de Arthur, e formaram uma torcida para acompanhar e incentivar os atletas durante as partidas.
- Eles têm uma conexão muito forte. Quando o Arthur já estava no Flamengo, eu via a satisfação no Iago. Acho que ele pensava que queria estar onde o amigo estava. É como se fossem irmãos mesmo. O Arthur tinha muito a expectativa de o Iago ir para o Flamengo - disse Marília.
Após a morte de Arthur, Marília deu de presente a Iago diversos itens que pertenciam ao filho, como camisas, bermudas e uma chuteira, que ele levou nos primeiros dias no Ninho.
streia no Flamengo com a camisa 4 de Arthur
Até chegar no Flamengo, Iago sempre atuou como zagueiro pelo lado direito, com a camisa 3. Nos treinamentos antes de sua estreia também foi assim. No dia de seu primeiro jogo, no entanto, sua dupla de zaga passou mal e desfalcou o time. Quis o destino que Iago atuasse pelo lado esquerdo, com a camisa 4. A mesma usada por Arthur.
Na partida contra o Volta Redonda, onde eles haviam atuado juntos e despertaram o interesse do Fla, Iago marcou um gol e dedicou ao amigo.
- Foi uma emoção única o primeiro dia. Flamengo, né? Melhor time do Brasil, um dos melhores do mundo. Uma emoção inexplicável. Tendo o Arthur jogado lá também... é muito difícil. Minha estreia foi com a mesma camisa que o Artur usava, contra o Volta Redonda, onde a gente tinha jogado juntos, e também fiz o gol. Isso sempre vou lembrar. Fiz o gol de cabeça e levantei as mãos para o céu para agradecer.
Marília contou que o filho Arthur não gostava muito de jogar como zagueiro. Antes, era volante. Mas na posição conseguiu se destacar e até foi convocado para seleção brasileira.
- É coisa de Deus mesmo. O Artur jogava em outra posição, nunca foi zagueiro. Não gostava. Mas depois de cinco meses nessa posição foi convocado para seleção brasileira.
Sempre com Arthur no pensamento, Iago segue sua trajetória no Flamengo em 2020 com o objetivo de realizar seu sonho e o do amigo de se tornar jogador profissional.
- A força que o Arthur passa para ele é uma coisa de Deus. Ele joga para conquistar as coisas por ele e pelo Arthur - disse Altamiro.
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