Na cultura do futebol imediatista de hoje, não é nenhum exagero dizer que de um jogo para o outro um time passa de melhor do planeta para uma equipe de Série B e o craque da último jogo logo é chamado de perna-de-pau.

Isso acontece porque no futebol só importa as vitórias. Nunca esquecemos as derrotas do nosso time. Principalmente aquelas em que ele acabou falhando no momento decisivo e perdeu um título depois de fazer tudo certo durante a temporada.

Qual torcedor não teve os seguintes pensamentos após uma derrota sofrida?

"Dá para esquecer aquele chute que passou rente ao poste? Se a bola entrasse, eu não nunca estaria filosofando sobre a derrota; eu estaria comemorando o título com os meus amigos. Eu não ficaria sentado na arquibancada vazia olhando para o chão com os braços na cabeça, enquanto o torcida deles comemorava.

E não foi só eu. Naquele dia houve um monte de torcedores, que assim como eu, pensaram no que o atacante deveria fazer naquele momento crucial. Eu pensei em "n" alternativas para o lance, mas ele tomou a pior decisão possível.Não vale nada ele ser o maior artilheiro do clube se não fez justamente aquele que seria o gol mais importante.

Aliás, se aquela bola entrasse, o atacante seria o meu maior ídolo. Daria até o nome dele para o meu filho, para todas as vezes que eu chamasse minha cria eu também me lembraria dos gols que ele marcou com a camisa do meu time, principalmente o tento do título. Também, tenho certeza, o meu filho torceria para o mesmo time do que eu.

Se tivesse saído aquele gol, a situação do meu clube hoje estaria bem melhor. Manteríamos a base daquele elenco e tenho certeza que teríamos a hegemonia do futebol brasileiro e venceríamos, no mínimo, dois Mundiais de Clubes. Mas, com aquele chute para fora, o time foi desfeito, perdemos jogadores e hoje somos apenas coadjuvantes nos torneios que participamos.

Ah, se aquela bola tivesse balançado a rede, uma geração de jogadores teriam conquistado um tão merecido título. Só que boa parte deles se perderam na carreira, se transformaram em atletas comuns e agora brigam para atuar em equipes modestas. A carreira deles acabou quando aquela bola não entrou e eles só descobriam isso anos depois. Até o nosso goleiro que nada teve a ver com o chute torto do atacante acabou sendo sacrificado.

Penso que, se aquela finalização fosse certa, eu até conseguiria elogiar os cartolas do meu clube, historicamente incompetentes.

E o nosso técnico? Até hoje é chamado de perdedor. De repente, o cara que era apontado como o melhor treinador do país, um dos poucos que conseguia dar padrão de jogo para um time e visto como revolucionário, passou a ser taxado de inventor e pé-frio. Se a chance clara não tivesse sido perdida, ele comandaria a seleção ou um grande clube da Europa.

Se aquela bola entrasse eu saberia o que é ser realmente feliz."
(adaptação e atualização de um texto meu de 2014 e que faz todo o sentido ainda nos dias de hoje).

Humberto Luiz Peron