Bandeira de Mello afirma: Clubes não mandam em nada no futebol brasileiro

17/10/2018 07:45

Bandeira de Mello afirma: Clubes não mandam em nada no futebol brasileiro

Em entrevista exclusiva, presidente do Flamengo faz balanço dos mandatos à frente do clube, critica calendário do futebol brasileiro e falta de poder das agremiações

Bandeira de Mello afirma: Clubes não mandam em nada no futebol brasileiro
Bandeira de Mello - Presidente do Flamengo (Foto: Gilvan de Souza/Flamengo)

A partir de janeiro do ano que vem, Eduardo Bandeira de Mello não será mais o presidente do Flamengo, cargo que ocupa desde 2013 - dois mandatos. Próximo ao adeus ao cargo máximo do Rubro-Negro, o mandatário recebeu o LANCE! e realizou uma avaliação do trabalho realizado neste período à frente do clube da Gávea.

Crítico do calendário futebol brasileiro, que considera 'irracional', Bandeira aponta algumas soluções e garante que dirigentes de outras agremiações têm visões parecidas, mas ressalta lamenta o fato de os clubes não terem voz frente as entidades que comandam o esporte.



- Vários clubes têm a mesma visão do Flamengo, mas isso não depende dos clubes. Os clubes não mandam em nada no futebol brasileiro. Os clubes só têm de obedecer e ficar calado - disse.

O presidente entrou ainda em diversos outros assuntos, como a Primeira Liga (competição que foi um dos idealizadores), contratação que achou mais emblemática neste período, eleição presidencial do Flamengo, eleição para deputado federal - concorreu pela Rede - e até realizou uma projeção de como imagina o Rubro-Negro daqui a uma década.

Sobre a negociação envolvendo o meia Lucas Paquetá, ao ser questionado, afirmou que ainda não poderia dar maiores detalhes (nota da redação: a entrevista foi realizada na última quinta-feira. Nesta quarta, o mandatário e dirigentes darão uma coletiva).

Esse longo bate-papo, realizado no CT Ninho do Urubu, em Vargem Grande, Zona Oeste do Rio de Janeiro, pode ser conferido a seguir.

LANCE!: O que vem à sua cabeça quando pensa nos seis anos à frente do Flamengo?
Eduardo Bandeira de Mello: A primeira coisa que vem à minha cabeça foi o dia da minha posse, aquele discurso que fiz, em que falei que o Flamengo estava em uma situação caótica, que além do passivo financeiro, que era quase que insuportável, tínhamos um passivo ético, moral, e que nós não íamos medir esforços para tentar mudar essa situação, ainda que sacrificando, eventualmente, objetivos na área esportiva e social. Na hora que estou acabando, a primeira coisa que eu penso é no que falei quando estava começando. Acho que, neste sentido, tudo que foi falado naquele discurso foi cumprido e acho que ultrapassamos. Hoje, o Flamengo é tido como exemplo por seus torcedores, ganha todos os prêmios de transparência, de gestão esportiva. E ele, realmente, mudou de patamar. Ainda que não tenhamos conquistado todos os títulos que gostaríamos, o clube mudou de patamar na área esportiva, passou a disputar as primeiras colocações quando, antigamente, disputava para não ser rebaixado. Avançou na infraestrutura, antigamente se treinava em um local péssimo, com barracão, lama para os jogadores pisarem... Hoje, temos um CT que é um dos melhores do Brasil e mês que vem vamos inaugurar o que, seguramente, é o (departamento de futebol) melhor do Brasil e esse aqui vai ficar para a base.

O trabalho de base também vinha sendo negligenciado. Cheguei a ouvir a estupidez de que o Flamengo tinha de parar de investir na base e comprar jogadores prontos. Claro que isso não podia ser levado a sério e, hoje, o Flamengo tem um trabalho de base que está se aproximando àquele que tinha lá no começo dos anos 80, quando éramos referência mundial. Na últimas três Copinhas, ganhamos duas, jogadores convocados para a Seleção Brasileira desde 11 anos até 20. Tudo isso garante que o Flamengo, daqui para frente, venha a ser forte, que a gente venha a disputar tudo e sempre. Sem falar nas outras coisas todas que estão ligadas ao futebol também, como o centro de excelência e performance, o que temos de equipamentos e recursos humanos nessa área é muito mais do que se podia imaginar em 2013. A área de inteligência e mercado também. Isso para falar de futebol. Se falarmos de patrimônio, resolvemos a questão do Morro da Viúva (prédio que pertencia ao Flamengo, no bairro do Flamengo, Zona Sul do Rio), estamos com os dois centro de treinamentos, um pronto e o outro engatilhado, melhorias na Gávea, apesar de ter muita coisa a se fazer ainda.

No esporte olímpico, temos o esporte olímpico do Flamengo praticamente autossuficiente. Programa "Anjo da Guarda" é um programa que deu certo e está nos ajudando a bancar os esportes olímpicos, totalmente voltado à formação de atletas, ao invés de contratar medalhões que nem vinham treinar no clube. Acho que, nesses cinco anos e nove meses, evoluímos muito. Claro, poderíamos ter feito muito mais, mas saio com a consciência tranquila de que foi feita muita coisa e acho que deu para considerar uma boa etapa.

'Claro que, em cinco anos e meio, tem muita coisa que, se pudesse voltar atrás, certamente não faria. Por exemplo, no início da minha gestão, dei muita autonomia para o departamento de futebol, ao vice-presidente de futebol (Wallim Vasconcelos) e isso não se mostrou uma boa estratégia'
Ainda neste balanço, quais acredita terem sido os pontos positivos, os negativos e qual o melhor momento?
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O que foi bom, eu falei. Esqueci de falar da questão financeira. Hoje, o Flamengo multiplicou por três o faturamento e reduziu a dívida bem menos que a metade. Uma coisa que me empenhei pessoalmente, que acho que foi fundamental, não só para o Flamengo, como para outros clubes também, foi a questão do ProFut (lei sancionada em 2015 pela então presidente, Dilma Rousseff, que obriga que os clubes de futebol estejam em dia com suas obrigações fiscais e trabalhistas), com o refinanciamento da dívida tributária dos clubes. É um refis com contrapartida, como se nunca fez no Brasil. O refis dos clubes de futebol veio acompanhado de um conjunto de medidas que fizeram os clubes mudarem de patamar nessa área gerencial e financeira. Então, entre as conquistas deste período, todas as citadas anteriormente, mais essa também.

É claro que, em cinco anos e meio, tem muita coisa que, se pudesse voltar atrás, certamente não faria. Por exemplo, no início da minha gestão, dei muita autonomia para o departamento de futebol, ao vice-presidente de futebol (Wallim Vasconcelos) e isso não se mostrou uma boa estratégia. De determinado ponto em diante, passei a agir em conjunto com o vice-presidente de futebol, acho que mais presente no dia a dia. Com isso, conseguimos avançar muito naqueles pontos todos que falamos.

O "turnover" (troca de pessoal) dos treinadores é uma coisa que temos de aprender a lidar no futebol brasileiro, não só o Flamengo. Essa coisa de o time vai mal durante um tempo, vai lá e troca o treinador. Acho que isso não é uma medida acertada, mas, muitas vezes, se torna inevitável. Então, confesso que precisaria de mais tempo para aprender a lidar com isso. Reconheço que não é a melhor maneira de se lidar com a situação. Poderíamos, talvez, ter evitado algumas trocas de treinador, mas, agora, está feito, é aprender e tentar melhorar no futuro, na administração do Lomba.



Você falou do ProFut. O Flamengo vem cumprindo com as obrigações, mas outros clubes, nem tanto. Acha que o Flamengo vem sendo prejudicado por isso?

Acho que a APFut (Autoridade Pública de Governança do Futebol) está fazendo um bom trabalho. Também faço parte porque sou conselheiro. É o início de um trabalho porque não existia nada no futebol brasileiro. Então, a própria ProFut sofreu um pouco com a transição na época do impeachment (de Dilma Rousseff). O trabalho que está sendo feito lá é bom, está se trabalhando em bases seguras para o dia que se for punir algum clube, isso for coberto de toda a segurança jurídica. Mas acho que a própria ação preventiva da APFut já tem ajudado a vários clubes. Você vê que, de vez em quando, tem clube que se vira para pagar as prestações atrasadas, se preocupam com as contrapartidas. A APFut está, efetivamente, fazendo um trabalho com todas as dificuldades que ela tem. Pode não ser o ideal, mas é muito melhor do que se não tivesse nada e tenho certeza de que isso está sendo levado em consideração pelos clubes na hora que existe uma tentação para se escapar da linha correta.

'O calendário brasileiro é totalmente irracional. Ele tenta colocar muita coisa dentro de um ano e o ano só tem 52 semanas. Então, isso leva a vários problemas'
O calendário brasileiro é, ano a ano, questionado...

O calendário brasileiro é totalmente irracional. Ele tenta colocar muita coisa dentro de um ano e o ano só tem 52 semanas. Então, isso leva a vários problemas. O Brasil deve ser um dos poucos países em que se disputa competições oficiais nas datas-Fifa, isso gera distorções como nesse caso recente do Flamengo na semifinal da Copa do Brasil, em que teve de se privar do principal jogador porque ele foi convocado para disputar uma amistoso inexpressivo. Isso, seguramente, não acontece em um país que leva o futebol a sério, que leva as competições a sério. E a questão do planejamento, questão da vontade política. Esbarramos na estrutura arcaica das entidades de administração do futebol brasileiro. É óbvio que se tinha de dar um tratamento mais racional para os Estaduais, mas como quem define o poder na CBF (Confederação Brasileira de Futebol) são as federações, é muito difícil que isso aconteça espontaneamente. Certamente, isso que vai te ser resolvido de fora para dentro, via legislação por exemplo. Não dá para esperar que o sistema se corrija espontaneamente. A legislação deveria garantir mais poder aos clubes.

Alguma chance de haver uma chapa alternativa encabeçada pelos clubes?

Nós tentamos. Na época da Profut, foi conseguido que todos os clubes da Série A e da Série B tivessem voto nas Assembleias da CBF. Isso daí, talvez, não fosse um avanço muito grande, mas era um início. Se passou a ter 40 clubes e 27 federações na Assembleia, mas isso foi desvirtuado graças a uma manobra que impediu que os clubes participassem das Assembleias Administrativas e, em uma Assembléia Administrativa, se deu peso diferenciado às federações em relação aos clubes. Ou seja, voltou tudo como era antes e, hoje, em uma eleição da CBF, os clubes não tem peso nenhum. Se tiver lá uma quantidade de votos da federação, 20 se não me engano, não se precisa de clube nenhum para eleger o presidente da CBF.

Se os clubes fossem mais unidos, poderiam ter mais força política, talvez. Mas nem sempre os clubes estão pensando a longo prazo. Muitas vezes, estão pensando no jogo da semana seguinte, que estão com medo de ser prejudicado pela arbitragem ou com medo de serem prejudicados no STJD (Superior Tribunal de Justiça Desportiva). Então, isso não é uma tarefa fácil, não, mas não pode ser negligenciada, tem de continuar tentando.

'É absolutamente impensável que um amistoso contra El Salvador seja mais importante que uma semifinal de Copa do Brasil. O que é pior, depois que a outra data se abriu, que poderia adiar a semifinal do dia 12 para o dia 19, ainda assim, não foi feita a mudança, tendo prazo e tudo, o que nos leva a pensar o que está por trás disso tudo'

Como está a relação do Flamengo com a CBF (Confederação Brasileira de Futebol)?

Durante meu mandato, o Flamengo sempre teve uma postura independente em relação à CBF, porém, não hostil. Tenho diálogo com o presidente, diretores. Toda vez que os procuro, me atendem com educação, com cordialidade, porém, em um caso como esse (Paquetá na Seleção às vésperas da semifinal da Copa do Brasil), fica evidente que a coisa poderia ir muito além da cordialidade. Esse foi um caso claro em que a própria entidade que promove a competição não deu a devida importância, não respeitou a competição, não garantiu o equilíbrio da competição. Em uma competição esportiva, as questão ligadas ao equilíbrio, ao esporte, têm de ficar em primeiro lugar. É absolutamente impensável que um amistoso contra El Salvador seja mais importante que uma semifinal de Copa do Brasil. O que é pior, depois que a outra data se abriu, que poderia adiar a semifinal do dia 12 para o dia 19, ainda assim, não foi feita a mudança, tendo prazo e tudo, o que nos leva a pensar o que está por trás disso tudo.

Você foi um dos idealizadores da Primeira Liga, o que faltou à competição para que ela "engrenasse"?

A Primeira Liga foi uma tentativa de se encontrar um produto alternativo aos Estaduais, todos eles altamente deficitários, pouco atrativos técnica e financeiramente. E entendeu-se que seria um movimento importante. Teve ações, ameaças, mas a gente conseguiu fazer dois anos de Primeira Liga com todas as dificuldades. Neste ano, por conta do calendário, ficou praticamente impossível. Teve Copa do Mundo, então, ficou praticamente impossível jogar a Primeira Liga e entendeu-se que era melhor interromper para voltar no ano seguinte. Tivemos alguns problemas internos na entidade também, mas a questão principal do calendário não vai se resolver através da Primeira Liga. Vai se resolver através de se dar a importância para as competições nacionais em relação às Estaduais. Vamos ter um calendário racional quando você puder, efetivamente, jogar todas as competições em condições mínimas de respeito aos jogadores, torcedores. E, nesse caso, é bastante claro que se deve ter um Campeonato Brasileiro nos moldes do atual, por pontos corridos, tem de ter a Copa do Brasil, tem de ter a Libertadores, e os Estaduais tem de ser disputados da maneira que der. Não pode dizer: "Nós vamos parar o país de janeiro a abril para jogar os Estaduais e depois espremer o calendário que interessa de maio a dezembro". Assim, nunca vai conseguir se chegar a uma solução que seja boa.



Em 2016, o técnico Muricy Ramalho utilizou um time alternativo na Primeira Liga e o titular no Carioca. Isso gerou algum desgaste?

A partir do momento que existe a Primeira Liga e o Carioca, não se tenta priorizar nenhuma delas. O que aconteceu que, por conta de desgaste, os índices que o clube calcula de cada jogador, se entendeu que o melhor time que o Flamengo tinha para jogar aquela semifinal (da Primeira Liga, contra o Atlético-PR) era o time que não era o time titular que vinha jogando sempre. Acabou que nós não passamos, porém poderíamos perfeitamente ter passado.

Os Estaduais são o grande nó para este calendário?

Sem a menor dúvida. Acho que os Estaduais deveriam ser jogados ao longo do ano todo. Inclusive, favoreceria os clubes pequenos, que teriam uma ocupação mais funcional no ano. Eles jogam o Estadual de janeiro a abril e depois ficam, praticamente, sem calendário. Acho que se deveria jogar o Estadual ao longo do ano e, eventualmente, se tiver uma data-Fifa, pode colocar uma data do Estadual e joga com time alternativo, que é uma competição de importância menor. Os Estaduais, poderiam, inclusive, ser usados para observar atletas. Acredito que poderia ser feito dessa forma. E aí, os campeonato realmente importantes não seriam sacrificados por essa irracionalidade do calendário. Acho que atenderia aos clubes pequenos também porque estariam ocupados o tempo todo. Eventualmente, ter de jogar contra uma equipe grande sem os principais jogadores não seria um problema tão grande. Ao meu ver, tem de manter os Estaduais. Há quem defenda a extinção. Acho que poderiam continuar, mas nessa linha.

'Vários clubes têm a mesma visão do Flamengo, mas isso não depende dos clubes, os clubes não mandam em nada no futebol brasileiro'

Flamengo encabeça diálogo para levar essa ideia à frente?

Isso tem de ser uma decisão a nível nacional. Vários clubes têm a mesma visão do Flamengo, mas isso não depende dos clubes. Os clubes não mandam em nada no futebol brasileiro. Os clubes só têm de obedecer e ficar calado.

Tem também a questão da televisão, pelo direito de transmissão, não é?

Não seria problema. Até porque não tem, no contrato com a televisão, a definição de quando a quando se vai jogar os Estaduais. E como a televisão tem também os direitos dos campeonatos nacionais, melhor para eles que seja um campeonato racional, que não sofra nenhum tipo de questionamento da atratividade ou do equilíbrio por conta de distorções como essa que aconteceu na semifinal da Copa do Brasil.

O Flamengo teve algumas evoluções, mas se bate muito na tecla de não ter conseguido os títulos. Acha tais críticas injustas?

Eu tenho de entender. Também sou torcedor e o papel do torcedor é cobrar. Se a gente sobe de degrau, ele vai querer sempre o degrau acima. E está certo! O Flamengo, também, nunca pode estar satisfeito com determinada situação, tem de estar sempre mirando mais à frente. Se formos campeão da Libertadores, vai querer ser campeão do Mundo. Se não for, eu vou me sentir frustrado, os torcedores vão se sentir frustrados também. Isso, eu acho natural. A cobrança é natural e eu tenho certeza que o torcedor, quando faz um balanço do que foi feito, ele reconhece (pontos positivos). E isso eu vejo nas ruas. Quando as pessoas me procuram, as pessoas reconhecem que o Flamengo evoluiu muito. Agora, satisfeito, ninguém está e nem eu estou. Isso faz parte da minha natureza, eu estou sempre querendo mais.

'Lomba foi a solução natural dentro do nosso grupo. Uma pessoas que a gente entende que tem todo o preparo, todas as condições. Acho até que tem um perfil parecido com o meu, embora sejamos diferentes em algumas coisas'

Esse ano terá eleição presidencial e o escolhido pela situação foi Ricardo Lomba. Por que ele? E, aproveitando, esse ano, com você como presidente e ele como vice de futebol e candidato, houve algum ruído na comunicação de vocês?

Não houve problema algum. Até porque, em 2015, eu era o presidente e era candidato. Tem de saber separar as coisas. Tanto eu quanto ele colocamos o Flamengo acima de tudo, acima, inclusive, do processo eleitoral. O Lomba foi a solução natural dentro do nosso grupo. Uma pessoas que entendemos que tem todo o preparo, todas as condições. Acho até que tem um perfil parecido com o meu, embora sejamos diferentes em algumas coisas. Ele tem um perfil parecido com o meu, torcedor de arquibancada, que só é sócio do Flamengo porque é torcedor, formação dele foi toda dentro do setor público, assim como a minha. Nosso grupo todo entendeu que, nesse momento, dadas às condições de todos... Claro que vários que trabalham em nosso grupo teriam também condição de postular a presidência, mas com a penetração do Lomba junto à torcida, junto aos sócios, entendemos que ele é a pessoa ideal para continuar esse trabalho para que o Flamengo continue a evoluir e, daqui a três anos, quando estiver terminando o mandato, possamos apresentar uma situação muito melhor.



Você se elegeu em 2012, com a Chapa Azul, mas já em 2015, quando tentou a reeleição, havia uma dissidência deste grupo inicial. Sentiu-se traído em algum momento?

Acho que todo mundo deve ter o direito a mudar de ideia e postular o cargo de presidente do Flamengo. O fato de termos estado juntos nos dois primeiros anos, não significa que tenham de ficar o tempo todo. Acharam melhor sair. Tudo começou por uma questão pessoal, mas, depois, vocês acompanharam o que aconteceu durante a eleição de 2015. A eleição se decide na urna, então... Eles colocaram a posição deles, nós colocamos a nossa e os sócios do Flamengo preferiram continuar com a Chapa Azul.

Recentemente, houve uma movimentação por impeachment, houve a questão da cor da chapa... Como você esses movimentos neste processo eleitoral?

Todo processo eleitoral, principalmente no Flamengo, já senti que é praticamente impossível evitar baixarias. Baixaria vai sempre ter, vai ter falta de educação. Já teve em 2015 e, aparentemente, em 2018 está ficando pior ainda. Procuro não deixar esse tipo de coisa interferir no trabalho do clube. O clube está acima de tudo. Não vou me pautar por ameaças de quem quer que seja e vamos continuar seguindo nosso trabalho. Tenho certeza que sem maiores percalços. Claro que o ideal seria que estivéssemos em uma disputa de alto nível, no plano das ideias, porém, se o outro lado não quer, não podemos fazer nada.

'Sabia que era uma eleição difícil porque o partido é pequeno, não tinha estrutura, não tinha dinheiro, não tinha tempo de televisão, mas como entrei nisso como parte de um projeto que eu acreditava, com uma pessoa que eu acreditava, fui em frente sabendo que era muito difícil, porém, me dediquei. Sem, é claro, neglicenciar o Flamengo'

Como foi disputar a eleição para deputado federal? Há algo diferente do processo do clube? Como viu sua votação?

Foi uma coisa totalmente nova. Não tinha experiência no assunto e entrei nesse processo motivado por duas coisas. Primeiramente, por pessoas, inclusive dentro do clube, pessoas da imprensa, que me estimularam a partir da constatação de que, como a política estava desacreditada, estava precisando de homens de bem e, por conta disso, eu deveria participar, de alguma maneira, do processo. Por outro lado, eu sempre fui eleitor e admirador da Marina Silva, a conheço desde que ela era ministra do Meio Ambiente (entre 2003 e 2008, no governo Lula) e eu era responsável pelo Meio Ambiente no BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social). Nos conhecemos daquela época e, quando comecei a pensar na ideia, não me surgiu nenhuma outra alternativa que não fosse trabalhar junto com ela.

Quando conversei com ela, a princípio, a ideia era simplesmente declarar meu voto e trabalhar para ajudar a elegê-la. Ela me colocou que o ideal seria eu me filiar ao partido dela, nunca tinha me filiado a partido nenhum, e disputar as eleições. A princípio, não era para deputado federal, Foi cogitado eu ser candidato a praticamente tudo, cheguei até ser cotado para ser o vice da chapa e, em cima da hora, quando todos os candidatos já estavam trabalhando, fui indicado a ser candidato para deputado federal.

Sabia que era uma eleição difícil porque o partido é pequeno, não tinha estrutura, não tinha dinheiro, não tinha tempo de televisão, mas como entrei nisso como parte de um projeto que eu acreditava, com uma pessoa que eu acreditava, fui em frente. Sabendo que era muito difícil, porém, me dediquei. Sem, é claro, neglicenciar o Flamengo. Não deixaria, como não deixei, o Flamengo desassistido em momento algum. Fui à frente, a votação foi insuficiente, mas acho que valeu a pena ter participado desse projeto. Saber que tive uma votação razoável. Outros com votação menor acabaram entrando, mas isso eu não reclamo porque eu sabia das regras do jogo, isso faz parte do processo. Temos de respeitar. Entrei para disputar e sabia disso. Lamento também que a Marina tivesse sofrido com essa polarização excessiva que a gente assistiu, os extremos ideológicos. Lamento mais por ela que por mim, mas é uma mulher de fibra e não vai desistir, vai continuar a batalha dela.

Sobre essa polarização, te preocupa o que pode acontecer a partir do ano que vem?

Claro. Acho que está todo mundo preocupado com o que pode acontecer. Mas vamos ver. Torcer para se aclararem e não serem tão feias quanto parece.

'Eu sou torcedor, queria muito ser campeão de tudo, mas tenho certeza que a gente fez tudo para que daqui para frente o Flamengo possa'

Algum desejo que não conseguiu realizar como presidente do Flamengo?

Tem vários. Gostaria de ser campeão de tudo. O que não consegui foi o que a torcida também não conseguiu, que foi ser campeão de tudo. Temos a chance, nesta reta final, do (título) Brasileiro. Eu sou torcedor, queria muito ser campeão de tudo, mas tenho certeza que a gente fez tudo para que, daqui para frente, o Flamengo possa, assim como já mudamos de patamar, de disputar na zona de rebaixamento para disputa de títulos... Temos certeza que fizemos bases sólidas e sustentáveis para ganhar os títulos. Isso, acho que ninguém duvida, mas é claro que, muitas vezes, a emoção faz com que a avaliação seja outra. Mas não reclamo de nada, não. Estou absolutamente tranquilo.

Você é um torcedor do Flamengo. Fica chateado de os torcedores, às vezes, imaginarem que você não se importa quando o time perde?

Todo mundo sabe que sou torcedor acima de tudo. Só fui presidente porque sou torcedor. Se não fosse torcedor, não seria sócio e não teria chegado à presidência do Flamengo. Acho que eles sabem disso. Qualquer torcedor fica chateado com a derrota. Tenho contato com as pessoas nas ruas e a maioria esmagadora tem a visão de que fizemos a coisa certa. Pode ter errado aqui ou ali, mas é impressionante o orgulho do torcedor do Flamengo, principalmente o torcedor que vem das classes mais humildes, tem desse resgate do passivo ético e moral do clube. Essa coisa de não pagar os compromissos... Estamos em outubro, alguns anos atrás, de repente, vocês estariam noticiando que o Flamengo pagou o mês de julho. Isso era notícia. Flamengo pagava a folha e isso era notícia. Hoje em dia, isso deixou de ser notícia porque não é para ser notícia. Trabalhei minha vida inteira em uma instituição que nunca atrasou meu salário nem 15 minutos. Flamengo paga todo mês no dia certo, isso não é mais que nossa obrigação. E o torcedor, principalmente dessas camadas mais humildes, tem muito orgulho disso. Ele se incomodava muito com o Flamengo sendo achincalhado com toda essa irresponsabilidade e hoje ele vê que a coisa é outra. Embora considere que seja nossa obrigação, ele sente orgulho de, pelo menos agora, estamos cumprindo. Apesar de todo mundo ficar chateado quando perde, e gosta de reclamar do técnico, jogador, presidente, entendo isso como natural. Tenho certeza que a grande maioria dos rubro-negros entende que a gente está no caminho certo e se conseguirmos ter continuidade no nosso projeto, isso nos levará a um patamar ainda mais elevado.

'A mais que sinalizou a mudança de condição do clube foi a do Paolo Guerrero, que ninguém acreditava. Ninguém acreditava que o Flamengo seria capaz de pegar o jogador mais caro do futebol brasileiro naquele momento e contratar'

Alguma contratação lhe marcou mais?

A mais emblemática, que sinalizou a mudança de condição do clube foi a do Paolo Guerrero, que ninguém acreditava. Tanto é que negociamos durante um tempão e não vazou porque ninguém acreditava que o Flamengo seria capaz de pegar o jogador mais caro do futebol brasileiro naquele momento e contratar. A reação de vários colegas de vocês (imprensa), principalmente na televisão, era aquela de "Está vendo? Não disse que essa coisa de austeridade e responsabilidade não ia durar? Agora, contrata o Paolo Guerrero. De onde vai vir o dinheiro para pagar?". Vai vir do orçamento, do fluxo de caixa do Flamengo. Pode ter certeza que cada centavo que for comprometido, vai ser pago. E, a princípio, as pessoas não acreditavam, ridicularizavam, riam. E, com o tempo, foram se acostumando que, realmente, o Flamengo vai, contrata e paga tudo. Esse ano, por exemplo, a gente trouxe o Vitinho e não vi ninguém dizer: "Está vendo? Sabia que não ia durar isso daí. Quero ver como vai pagar o Vitinho". Acho que o divisor, a mais emblemática, foi a que sinalizou que o Flamengo deveria ser levado a sério.

Aproveitando que citou o Guerrero como contratação mais emblemática, ficou algum ressentimento com a forma que ele deixou o Flamengo?

Não quero falar sobre a saída porque acho que não devemos ficar explorando coisas que não merecem. Afinal de contas, temos uma boa relação com o Internacional. Não desejo mal ao jogador, ele foi importante. E a questão do doping foi extremamente prejudicial a nós porque, quando ele foi suspenso, estávamos em uma reta final de Sul-Americana, reta final do Brasileiro. Poderíamos ter conseguido uma colocação melhor no Brasileiro, poderíamos ter ganho a Sul-Americana. Era o principal jogador do nosso ataque. Atrapalhou muito. Mas acho que não temos de ficar voltando atrás. O que passou, passou.

Teve algum jogador de peso que esteve perto de fechar e a negociação não se concretizou?

Teve alguns casos, mas acho que não... Alguns chegaram a vazar, mas não deu certo, como foi o caso do Ryan Babel. Esteve perto, mas a gente acha que foi vazada propositalmente pelo lado de lá (Besiktas, da Turquia) como estratégia de negociação e temos certos princípios que não nos permitem...Mas a vida tem isso. Tem coisa que a gente consegue, tem coisa que a gente não consegue.

Como torcedor e amante do futebol, dentro da realidade do futebol brasileiro, tem algum jogador que gostaria de ter trazido?

Não reclamo de nada. Claro que quando se fala de craque, gostaria de trazer o Neymar, Messi, Cristiano Ronaldo, Di Maria, enfim (risos).

O Dorival foi o primeiro técnico da sua gestão e, provavelmente, será o último. Como foi a negociação para este retorno?

Nunca ninguém teve dúvida da capacidade técnica do Dorival e da qualidade dele. Realmente, naquele momento (2013) tivemos de interromper porque nós não tínhamos condições de arcar. Quando a gente assumiu, Flamengo estava devendo quatro meses de salário, tinha dívida com a Fazenda Nacional, não tínhamos certidão negativa. Cada dia, olhávamos o fluxo de caixa e pensávamos: "Não vai dar, não vai dar. Deu, mas amanhã não vai dar". Então, era uma situação que nos obrigou a abrir mão do Vagner Love naquele momento. Tivemos de fazer sacrifícios. Hoje, a situação é diferente. Então, quando sinalizamos que gostaríamos de ter o Dorival, a situação era outra. Na próxima administração, o Lomba, caso vença, não terá dificuldade em manter o trabalho.



Só para o torcedor entender o pouco melhor, a dívida está menor, mas o Flamengo ainda precisa pegar empréstimos por conta de todo um processo. Seguindo essa política que foi colocada em prática, em quando tempo você acredita que o Flamengo vai "andar com as próprias pernas"?

O Flamengo, desde 2013 até hoje, e vai continuar assim, todo ano estamos reduzindo o passivo. Estamos pagando dívida. O que acontece é que o fluxo de caixa, ao longo do ano, é de um jeito tal que em um mês você paga 30, no outro você tem de captar 10. Depois, você paga 20 e, no outro, tem de captar cinco. E cada operação de captação, você tem de levar ao Conselho de Administração, mas se for olhar o ano como um todo, ao invés de olhar a fotografia, olhar o filme, vai ver que, na realidade, está reduzindo dívida. Talvez, fosse uma coisa para se propor para o futuro de que, enquanto o clube estiver reduzindo dívida, não precisa levar todas as operações ao Conselho de Administração, mas o estatuto diz isso, tem de levar e fluxo de caixa é assim. Melhor do que: "Vamos ver quanto você vai precisar o ano inteiro", pega tudo de uma vez e essa não é a melhor maneira de gerir. Então, não tem problema algum.

Quando acontece de ter de fazer essa operação de crédito, ainda que reduzindo o seu passivo, tem gente que não entende e tem gente que é mal intencionada. Da mesma maneira como no caso da operação do Guerrero. Colocam lá que o clube quer captar não sei quanto, aí falam: "Não disse que ia pagar dívida, para que está querendo captar?". Esquece que se você está querendo captar 20 agora, é porque você teve de pagar 50. Então, na realidade, no líquido, você pagou 30.

Toda empresa, independentemente de qual setor, privada ou estatal, tem de saber trabalhar com recursos de terceiros. Então, vai chegar um dia que o Flamengo vai, por exemplo, captar um financiamento para pré-pagar as prestações do ProFut, se o custo da captação for menor que custo que se paga. Se acontecer isso, não é que você vai estar pegando para pagar outra dívida, mas é uma operação de crédito, tem de levar ao Conselho. A gente respeita, a gente leva, mas sabe que, muitas vezes, isso é usado... Tem uma outra visão de quem é mal intencionado.

'o Flamengo tem todas as condições de assumir a administração do Maracanã. E o Maracanã na mão do Flamengo será um excelente negócio tanto no ponto de vista esportivo como no ponto de vista financeiro, tanto para o Flamengo como para o Estado'
Há sempre uma pauta que permeia o Flamengo que é a questão do estádio próprio...

A questão do estádio é um sonho da torcida do Flamengo que vai se concretizar muito em breve. Acho que isso não é novidade para ninguém, o Flamengo tem todas as condições de assumir a administração do Maracanã. E o Maracanã na mão do Flamengo será um excelente negócio tanto no ponto de vista esportivo como no ponto de vista financeiro. Tanto para o Flamengo como para o Estado, ou seja, para os contribuintes. Nós temos isso em nosso radar, vamos conversar com os candidatos ao Governo no segundo turno (Eduardo Paes e Wilson Witzel) e vamos apresentar a solução que nós temos para o Maracanã. E os outros clubes? Os outros clubes serão respeitado. O que defendemos é que haja uma nova licitação e, ao contrário da anterior, os clubes têm de poder participar. Podendo participar, o Flamengo vai se habilitar. E tenho certeza que faremos uma proposta que será uma proposta para ganhar. Nisso, eu pensando não só como torcedor do Flamengo, mas como esportista e como contribuinte.

Agora, se acontecer de o Governo achar que não deve fazer licitação, que deve entregar para uma empresa sei lá qual, que os clubes não devem participar, o Flamengo, hoje, tem condições de comprar um terreno e construir um estádio. É um projeto a longo prazo porque ninguém constrói um estádio da noite para o dia. Isso leva quatro, quatro anos e meio. Temos condições, mas será lamentável porque se o Flamengo construir um estádio, o que será do Maracanã? Maracanã vai, talvez, apodrecer. Tem de se pensar em uma outra alternativa, aquela coisa de ter Papai Noel no fim do ano, show de música, rodeio. Mas o ideal seria ter o Maracanã com futebol e na mão de um clube que tem todas as condições de administrar e tornar esse patrimônio do Estado do Rio de Janeiro um ativo rentável, atrativo financeira e esportivamente, sem onerar o contribuinte.

E como vai ser a vida pós-Flamengo? Já tem algo planejado?

Estou avaliando ainda. Tem algumas possibilidades no radar, mas, com certeza, da arquibancada eu não vou fugir. Acima de tudo, rubro-negro.

Como projeta o Flamengo daqui a 10 anos?

Se continuar nessa linha que seguimos, daqui a 10 anos vamos ser um clube no nível dos clubes da Europa. Não vamos precisar negociar nossos atletas, pelo contrário, vamos buscar se necessário. Não tenho a menor dúvida que o Flamengo, seguindo nesta rota, daqui a 10 anos será uma potência do futebol mundial. Agora, se não seguir, pode voltar algumas casas. Mas vamos confiar que a coisa vai continuar. Acho que os sócios do Flamengo já perceberam que o caminho certo é esse.

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